Pareceria cruel demais imaginar Caifás, sumo sacerdote, imolando o
Deus-Homem no altar do holocausto e queimando suas carnes.
Mas não era isto mesmo que ele fazia todos os anos como sombra
nas comemorações sucessivas da Páscoa?
Não era ele o representante máximo da “adoção de filhos, e a
glória, e os concertos, e a lei, e o culto, e as promessas”?
Não conhecia ele o exemplo santo da maior figura de um holocausto
humano, o submisso Isaque?
Ele mesmo não havia profetizado um pouco antes que ‘convinha que
um homem morresse pelo povo, e que não perecesse toda a nação’?
Ao invés de um sacrifício pacífico, pela fé, proposto por Deus,
optou-se, em incredulidade, por um homicídio hediondo, perpetrado
por homens ímpios.
Faremos um rápido comentário após um pequeno trecho compilado dos 4 Evangelhos em um só texto.
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Para acessar a compilação completa dos Evangelhos, clique Do Verbo à blasfêmia dos fariseus
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Jesus perante Pilatos e perante Herodes
(Mt 27:11-31; Mc 15:2-20; Lc 23:2-25; Jo 18:28-19:16)
E foi Jesus
apresentado ao presidente para a
audiência. E era pela manhã cedo. E não entraram na audiência,
para não se contaminarem, mas poderem comer a páscoa.
Então Pilatos saiu fora e disse-lhes: Que
acusação trazeis contra este homem?
Responderam-lhe, e disseram-lhe: Se este não
fosse mal feitor, não to entregaríamos.
Disseram-lhe então os judeus: A nós não nos
é lícito matar pessoa alguma. (Para que se cumprisse a palavra que
Jesus tinha dito, significando de que morte havia de morrer). E
começaram a acusá-lo, dizendo: Havemos achado este, pervertendo a
nossa nação, proibindo dar o tributo a César, e dizendo que ele
mesmo é Cristo, o rei.
Tornou pois a entrar Pilatos na audiência, e
chamou a Jesus, e o interrogou dizendo:
Tu és o rei dos Judeus?
Respondeu-lhe Jesus: Tu dizes isso de ti mesmo,
ou disseram-to outros de mim?
Pilatos respondeu: Porventura sou eu judeu? A
tua nação e os principais dos sacerdotes entregaram-te a mim: Que
fizeste?
Respondeu Jesus: O meu reino não é deste
mundo: se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos,
para que eu não fosse entregue aos judeus: mas agora o meu reino não
é daqui.
Disse-lhe pois Pilatos: Logo tu és rei?
Jesus respondeu: Tu dizes que eu sou rei. Eu
para isso nasci, e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da
verdade. Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz.
Disse-lhe Pilatos: Que é a verdade?
E, dizendo isto, tornou a ir ter com os judeus,
e disse-lhes: Não acho culpa alguma neste homem.
E, sendo acusado pelos príncipes dos
sacerdotes e pelos anciãos de muitas
coisas, nada respondeu.
E Pilatos o interrogou outra vez, dizendo: Nada
respondes? Não ouves quantos testificam
contra ti?
E nem uma palavra mais
respondeu, de sorte que o presidente estava muito maravilhado.
Mas eles insistiam cada vez mais, dizendo: Alvoroça o povo ensinando
por toda a Judeia, começando desde a Galileia até aqui.
Então Pilatos, ouvindo falar da Galileia, perguntou se aquele homem
era galileu. E, sabendo que era da jurisdição de Herodes, remeteu-o
a Herodes, que também naqueles dias estava em Jerusalém...
• • •
Quando lemos os Evangelhos,
referentes ao julgamento feito por Pilatos, de forma separada,
deixamos, de um lado, escapar o verdadeiro esforço de Pilatos em
soltar Jesus, e de outro, a manipulação, por parte dos líderes
religiosos, em convencer a “multidão maldita que não sabe a lei”
e o próprio Pilatos, de que Jesus era um criminoso. Tem-se a
impressão de um jogo rápido, de um Pilatos inerte,
descompromissado, alheio às necessidades do seu réu.
Mas não foi assim. Quanto mais os líderes acusavam Jesus, mais Pilatos o
justificava, chegando a declarar sua inocência por seis vezes (acessível no texto compilado).
Os quatro textos, embora
isoladamente pareçam do mesmo teor, desvendam uma sequência
admirável quando confrontados mutuamente.
Além da sequência ser precisa
quanto à continuidade das falas, e quanto às seis justificações
de Pilatos, mantém um enredo sempre crescente e envolvente, com os
judeus jogando com todas as armas disponíveis em seu arsenal
diabólico, passando pelas mentiras, pela manipulação do povo
contra Jesus ao incitá-los a pedir Barrabás, e posteriormente
incitando-os novamente a que o crucificassem, e, por fim,
constrangendo cinicamente a Pilatos, ao insinuarem sua deslealdade
para com César.
Aqueles sacerdotes, “dos quais
é a adoção de filhos, e a glória, e os concertos, e a lei, e o
culto, e as promessas; dos quais são os pais, e dos quais é Cristo
segundo a carne”, corrompem, visível e despudoradamente, o
“coração da lei”, persuadindo um gentio, “separado da
comunidade de Israel, e entranho aos concertos da promessa, não
tendo esperança, e sem Deus no mundo”, resoluto da inocência do
rei dos judeus, pois já havia “determinado que fosse solto”, a
crucificar “o Santo e o Justo”, “o Príncipe da vida”,
pedindo, em troca, “um homem homicida” (Rm 9.4-5 / Ef 2.12 / At
3.13-15).
Pilatos, numa artimanha ousada,
atende parcialmente o pedido dos judeus soltando Barrabás. Mas não
entrega Jesus para ser crucificado. Resolve castigá-lo, para depois
soltá-lo. Pensou que se o povo o visse maltratado e ferido o
esqueceriam. Manda até que eles mesmos o crucifiquem, diante de sua
inocência.
Mas a consciência nebulosa de
Pilatos foi barrada pela intervenção poderosa e cruel do nome de
César. Como “a amizade do mundo é inimizade contra Deus”,
“lavou as mãos diante da multidão”.
Não estou querendo,
absolutamente, inocentar Pilatos, que tinha como obrigação áurea
zelar pela justiça. Quero apenas lembrar que havia alguém em pior
situação que a dele: Caifás, de quem Jesus fala: “aquele que me
entregou a ti maior pecado tem”.
Pilatos foi, de longe, o menor
dos inimigos do Senhor.
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